O ar

terça-feira, 13 de maio de 2008

Ah! O ar, esta onipresente emulsão de gases que nos envolve, nos invade, nos permite viver, falar, sorrir, chorar. Sim, fluido gasoso da vida, mas que em si também transporta bactérias, o carbono cancerígeno, as pestes mortais. Percebeste, leitor, ao ler meus textos neste humilde e abandonado site, o quanto me aprazem os paradoxos?

Talvez seja porque tudo nesta vida é paradoxal, à medida que a vida em si é um paradoxo. Já me disseram que “a dor e a delícia de ser quem é, cada um é que sabe”. Tão presentes dores, apagadas e distantes delícias, sois a composição da minh’alma! E assim é também a nossa preciosa e indispensável atmosfera, já pelos antigos considerada um elemento, parte fundamental da vida, ainda que só fosse notado quando em movimento, quando sentido, ao tocar as extremidades do corpo, as superfícies dos objetos e da vegetação, sendo portanto denominado vento.

Vento oeste, que me endoidece, tu alimentaste meus ímpetos, implantaste em meu ser a confusão, entornaste o caldo do meu mundo, aliás, não apenas isto, como também viraste a tigela de boca para baixo. Vento da sandice, porque paraste? Uma vez feita a confusão, devias é continuar a me ensandecer, para que, louco, não fosse capaz de perceber a minha nudez. Mas não é do teu feitio, ó lúgubre e pesado vento: nunca te demoras mais que o suficiente para deixar por detrás um rastro de confusão!

Leve brisa do mar, tu sopraste em seguida, tocando a minha tez e as maçãs do rosto, aliviando-me a angústia, secando o meu suor e, como se estivesse suavemente tocando a chama sôfrega de uma vela prestes a se apagar, deste-me nova vida, trouxeste à triste chama o essencial e comburente oxigênio, permitiste-me um breve interlúdio de esperança.

Ora, mal sabia que estavas apenas a pavimentar o caminho para os tempestuosos sopros sulinos, do Minuano da minha vida, que sem aviso chegou e, ao encontrar a pobre chama já vivaz e esperançosa, de uma vez só a apagou, e hoje de mim emana a triste fumaça do pavio ainda quente, enegrecido, em brasa. A cera, antes líquida, calorosa e transparente, voltou a solidificar-se, tornou à sua opacidade comum, e não mais é possível enxergar através dela a solução.

Onde está aquela jovem que tanto anda presente em minha vida ultimamente? Como é seu nome? (Sou esquecido) Ah sim. Chama-se ACEITAÇÃO. Clamo por ti novamente, donzela! Não desistas de mim, és a única que me serve, me consola e me permite enxergar à frente o caminho a trilhar.


PS. Ao passo que sucede tudo isto, o que me persegue, e que ouço, incessante e insistetentemente, é "Que pena". Para mim, mais do que isso - um tragicômico "estar quites".